quarta-feira, 30 de abril de 2008

O Clube do Coma #8 apresenta uns ademais de Tereza

Eu gosto
do gosto
do sal
do seu
corpo carnal
(r. viana)



Foi assim que o velho escreveu, foi por vê-la tremendo enormemente, tremendo os peitos marrons. Chegavam a pingar. Do jeito que o diabo e os homens gostam, ele escreveu. Tereza é carne, Tereza é corpo. Pensei nisso ao vê-la pela segunda vez e, mesmo assim ela me intriga.
Ela tem os olhos distantes, por que me apego, por que me interesso? Ela não ri, ela ri muito pouco como se tivesse guardando de mim, quando tomamos uma Coca, todos os mistérios metafóricos que há na Bíblia até meado dos livros de... Mas Tereza é rasa, Tereza é rasa e infinita como as praias salgadas em que você caminha metros, metros à dentro com a água sempre nos joelhos. Seu mistério e atração são a amplitude, nunca o que haveria demais. Não há nada demais a ser visto.
Hoje a vi sem blusas e não compreendo onde ali tem carnaval. Tereza... você é só carne, você nunca sorri, nem ouve... é como se eternamente ouvisse uma música, uma mesma música, que te interessa em todas as audições ainda que você não encontre novidade entre uma vez escutada e outra. Entendem? É como se ela ouvisse a mesma música eternamente, a repetisse. Ela se interessa pela canção todas as vezes, em todas as introduções. E não encontra nada de novo, nenhuma diferente percepção sobre o arranjo. Ela samba assim, cadente, com os seios balançando, séria porque ouve com atenção os compassos e cada batida. O que diz não importa, Tereza me parece possuída por uma capacidade de perceber só o que é vibração.
Quando o samba termina, quando o carnaval não termina, ela guarda tudo, guarda a saia. Tereza dá pra todo mundo, em preferência por homens, nunca se aproximou duma mulher - eu penso e sou logo a primeira - Tereza se contorce em qualquer parede e geme muito alto. Deve gostar. Ela bate as asas, vai-se embora e, se for desconhecido, como sempre é, o que teria mais pra ver?

E, enquanto lembro ou invento isso...
Quando o cão apareceu não foi nessas noites, nesses dias. Chegando de Resende, chegando à cidade, Tereza pegou um trem porque nunca tinha andado de trem e parou em Nova Iguaçú na estação de Comendador Soares. Entrou nas escadas das passarelas e passou por elas e viu os vendedores, o cheiro de gente que vendia coisas. Ela deu seus muitos passos na mistura das plantas, dos cartuchos de Atari e dos mutilados. Pegou o trem de volta.
Se estabeleceu sem dificuldades em Santa Teresa - para fins de recomeço sagrado - e trabalhava fazendo não sei o que, honestamente. O viu num bar e ele poderia se chamar qualquer coisa. O viu num bar muitos anos depois de que chegou; dois ou três anos. O cão era um homem mesmo de bar. O que ele faz ali é que não sei, não sei.... deve entender dos vetores da sinuca. O conheci também no bar. Ele observava o olhar de Tereza com atenção exclusiva aos seus quadris. Deveríamos ter sabido desde o início que o único órgão dos sentidos de Tereza é seu útero. Ele soube e contabilizava os cascos de cerveja que ela levava lá pro boteco: pagava, ensacava e dois sacos e virava pra casa. Sei que ela o viu. Sei porque parou de enfiar um saco dentro do outro por cinco segundos mais longos.
O cão apareceu na porta da sua casa na noite seguinte, lá no fundo dava pra ouvir música e conversa junto dos balcões de ovo à milanesa do Morro dos Prazeres. Ele apareceu na porta da casa dela e ficou parado e ela chegou com as garrafas cheias e ele correu a ajudá-la. Resistiu à princípio, mas então destrancou o portão que já conhecemos e ele levou aos sacos, às cervejas e à ela. O cão surgiu à porta, depositaram tudo no tapete, ele se agarrou na boca de Tereza na lentidão inesperada, lhe cheirava os lábios. Ela avançava os braços em cima dele, mas ele não. Teve uma Tereza estancada, não a encostava em mais nada, ensaiou morder-lhe os mamilos por cima da blusa e foi por isso que ela caiu tão desfalecida... como cabia nele a pressa do fim? Maria encontrou-se desse exato modo em Tereza pela primeira vez. Fui consumida na vagarosamente, jamais entrecortada.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Léxico

léxico
do Gr. léxicon, relativo às palavras
s. m.,
dicionário de línguas clássicas antigas;
dicionário abreviado;
conjunto dos vocábulos de uma língua;
dicionário dos vocábulos usados num domínio especializado (ciência, técnica).

então... as minhas palavras precisam dumas suas pra soarem um pouco mais que sempre disseram

(com tanto, já desentendem) e precisam reverberar no que você me permite, no que me exige. e se não no corpo, aonde? sinto no corpo, sinto e espero a dor, então preciso das palavras denotadas. você as diz.
queria completar essas frases que são bem simples (imaginei bem simples) foi assim que me esqueci do...
umas tantas vezes fiz só silêncio e você perguntou: pensando em que? perco a expressão em minutos-litros quando te amo e não relembro. uns diálogos massivos com teu olho, e outro olho que ficam olhando em cima de mim. já me vi lá: lugar verde, os cabelos espalhando, uns modos de perdição brutal

sua metalíngua na minha boca.
emudeço

terça-feira, 22 de abril de 2008

Tentativa fracassada de escrever

É possível que seja simples como olhar sem ser
isso porque visão duvida

Foi um pouco assim, choveu em gotas grossas e depois amanheceu com sol. Espero passar dois minutos enquanto espero desenrolar a cena de todos os dias que acontece agora pela primeira vez: você reprovando o macarrão, eu na bancada pensando em fogo. Então louça, repolho, conversa e fruta. Todos os dias, e era a primeira vez.

Queria escrever de você com uns espaços do não dito, escrever com os desdizeres iguais que me contaram pra você e depois de você pra mim, mas são silêncios tão incompreensíveis que não consigo ver e sem ver me fico caída em fé. Deve ser por isso que pareceu destino descrito, retranscrito de metade dos livros que começamos a ler sozinhos aos doze anos. Só que escrevo, e não penso que há outra coisa que eu faça sem que minta, e não penso que há outra coisa que me materialize em humildes resistências (ao que aconteceu antes de eu nascer de manhã do teu lado, feita linguagem).

[entre-longa-pausa]
Desisto
[entre-longa-pausa]

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Corpo de texto

falo assim direto num vento que é pra não demorar, pra arrepender.

pra incompreender, eu pego e barroco tudo.


Imagino que, como se fosse água de chuva empoçada, esperava embaixo mesmo de uma baita chuva que fazia poças ao redor. Assim ninguém saía de casa, ninguém na rua, ninguém ia sair pra ouvir música pra ver nada, nem luz porque chovia pros cabelos grudando nas orelhas.

corpo de texto
o que saiu da roupa na água foi tinta verde azul, um verde azul claro meio desbotado - quanto como cal - mas fica forte depois. foi só colocar as mãos dentro do balde pra passar a cor pelo papel esfregando com as palmas o chão. entre uns cochichos e outros apareciam desenhos sem planejamento que foram expostos conforme algumas pessoas gostaram. eu daqui, pessoalmente não tiro esses vestidos, fico deixando a cor das estampas, das formas todas que formam e pontos, traços linhas, deixo elas indo cair pra longe e molhar outros pés que conheço, desconheço ou encontro na esquina. não tiro e não mudo, mal escolho, vou só pra cortar as arestas, bordar algo aqui, um botão pra perto da gola, uma bainha ou aplique de flor. entregas toda hora, às vezes demora uns dias, toda hora, qualquer uma assim... randômica! hora, roda, alinha-vão, colchete, manga, morango, limão.



-
vindo e re-tinto do dia 07/09/07
por ser algo escrito que tenho mui bem querer
lembra um talento queu devia ter, guardei em algum lugar, não sei aonde

terça-feira, 15 de abril de 2008

E (...) à nossa programação normal

parte em que toca uma música alucinado-deprimente do Belle & Sebastian, que só faz sentido no fim do filme

O médico lhe disse há anos atrás que ela estava doente
O médico lhe disse há anos pra tomar uma pílula
O médico disse há anos que ela ficaria cega se não se cuidasse

Eles deixaram Lisa ficar cega
O mundo estava sob seus pés mas ela estava olhando pra baixo
Eles deixaram Lisa ficar cega
Mas todo mundo que a conhecia, a achava bonita

Mas levemente retardada
Bonita, mas temperamental
Bonita, mas levemente retardada
Bonita

e (quase) voltamos à nossa programação normal
teste
quando eles costumam aparecer?
naquela época eu ainda costumava usar aquele vestido cinza de gola dobrada três vezes, fumava o Mallboro vermelho - que troquei pelo Hollywood verde agora. tinha aquela mania, se lembra? de beber e mandar scraps pelo orkut, de escrever frases do tipo "e ele bem se entregou todo à ela" numa reunião de expressões inúteis que adensavam os eventos mais vazios. nunca ignorei que só os eventos vazios importavam, era isso.
quando eles costumam aparecer?
não sei porque ele repetiu a pergunta. às vezes acho complicada a comunicação entre pessoas que não se conhecem e eu não o conhecia: vinte e um centímetros mais baixo do que eu e a voz mudava, engrossava, atrelava ao chão as observações mais dispensáveis. queria que eu o achasse bom pros meus diálogos e nunca tirei nada da cara de pedra que fazia.
não há literatura capaz de resgatar enchimentos ou lacunas que descrevam a agonia esbaforida de ter de tomar conta do primo adolescente que ouve Sandy e Junior. esperávamos os meus amigos imaginários que não iam vir, nem mesmo com neblina; nunca disseram que devia ser como As Brumas de Avalon. não viram. ele chegou dum aniversário de 15 anos e uma das lembrancinhas eram aqueles envelopes com fósforo.
e cinzeiros!
ele completou e eu já enfiava no bolso quase alucinadamente paralela.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Problemas técnicos: fora do ar! fora do ar!

o meu refrigerador não funciona...
(os mutantes)



senhores consumidores de limãoExpresso

informamos que nossos dispensáveis serviços estão indisponíveis por (sabe-se lá) cinco dias fatalmente inúteis por conta de reparos na conexão OI VELOX, a que nunca funcionou mesmo e que enrola muito para pagar toda vez que a processamos.

aguarda(mos?) a compreensão de todos e de todas

atenciosamente
SAC - serviço de atendimento ao consome-dor

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Frazier faz [dis]simulações de vôo em Beckett para piauí_18: aeronáutica existencial


segunda-feira, 7 de abril de 2008

Variações de leves ritmos

eu não era ninguém e era mil seres
C. Drummond

prende, força...

querendo como se fosse só a consistência, e, depois de tanta coincidência, de tanto ainda ficar, pronde mais ir? porque, se não no corpo, pra onde? (o amor aparece como os ratos dum navio afundando) à bom-bordo

atenta de escutar a tua voz, de escutar com atenção porque (verbo no pretérito imperfeito) impossível falar, foi assim que ficou: um suspiro e um advinhado desmaio em cada uma das palavras, das vírgulas da sua língua.
não é por fim que digo aqui o que não quero. é queda, mas sem fundo: atravessar umas milhas imaginativas porque, num pensamento forte, o que encontro à volta é só pele e quanto isso dói. você acredita que dói? como sente em você?
puxar o ar pelo nariz, soltar o ar pela boca, assim dizer de vez (recomendação sua, olha o preço do interurbano). demorou cerca de cinquenta e três horas a palavra sair e saiu torta porque, se não no corpo, pra onde? tropeçou sem nem beber. saiu letra por letra até virar frase que no total tinha muito pouco, mais escondido en-trepausas, fio de som mesmo. isso era necessidade confessada, necessidade protestada pelos meus dedos, meus cabelos, meu pescoço, minha boca, meus seios: com que castidade abria as coxas... minha vulva. e derretia toda a cautela - se bem que o dito não saía - então virou suspiro de beijo e só. me vejo no fundo duma garrafa tantas vezes... uma imensa garrafa vazia onde estou esperando um navio passar; pulando, dobrando os braços. o navio não passou.

me vejo tantas vezes no fundo de uma garrafa transparente, agora ela enche de algo que não sei o que é, que é fresco, fresco e quente, e sal, e Alice... toda cheia de mim, tão liquefeita de qualquer pedido teu, qualquer desejo teu, de diversas devoções pelas quais, hoje, vou acender velas na Lampadosa. e ansiosa porque... você me bebia, me retorcia e ali, exatamente ali.




disse baixo dos meus sentidos e os livros do quarto rodaram duas vezes quando senti vergonha. te desejo pros indefesos afetos do possuir. te desejo pelos meses em que nunca chegaram cartas. te deixo me colocar do seu lado sonâmbulo e disfarçado por saber que você mente bem, me escondo entre os vãos da poltrona pra que você não veja que eu danço e que gozo e que seu nome sai repetido quase rido, derretido; entraram em mim seus dedos. o amor.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Primeiro relato (quando ele gozou no imaginário)

Mas aos vinte e cinco anos ele ainda está sujeito à ereção, o homem moderno, fisicamente também, de vez em quando, é o quinhão de cada um, nem eu estava imune, se é que aquilo pode ser chamado de ereção. [...]
Não somos mais nós mesmos, nessas condições, e é penoso não ser mais você mesmo, ainda mais penoso do que sê-lo, apesar do que dizem. Pois quando o somos, sabemos o que temos que fazer para sê-lo menos, ao passo que quando não o somos mais somos qualquer um, não há mais como nos apagar.
Samuel Beckett


ele estava aparentemente sentado no sofá. em cima do sofá, faz acho que quatro dias, tinha um livro de capa preta com a foto do autor no lado esquerdo superior. ele estava aparentemente se dobrando sobre um rim e de repente, nesses que são nossos impulsos, levantou, levantou o corpo e ficou, e fitou. fitou ela e a mim, eu nela. não, nem sei. fitou apenas ela entre as suas pernas, ela abrindo suas pernas com os joelhos. então era o álcool dançando na nuca, subindo pro topo da cabeça, esse álcool, esse ela e ficou ereto numa explícita impossibilidade do escondimento, já que era fato. e mais do que os joelhos dela que tinham um hematoma roxo de queda, e mais que isso. na verdade não era um sofá, mas uma poltrona que ela tinha comprado verde pra que combinasse com a parede verde escura, ou cinza antigo, da cozinha. o homem é quem tem de ter a casa, o homem, nunca a mulher, nunca aquela exatamente alienígena mulher que lhe lembrava a dona, esposa do atendente da venda, a que tinha lhe pedido certa vez que alcançasse com o auxiliar de padeiro o maço de cigarros que ele deixou cair e foi catar. a dona viu os cigarros espalhados no chão e ele seria o que? um rapaz atarantado? não, o homem tinha sua casa e ele era filho do dono da venda. pegou o primeiro cigarro que prendeu entre o polegar e o indicador com toda a naturalidade que se fazia isso aos anos de 65 à 73, a melhor produção do Maverik, e a dona lhe pegou o dedo e encostou na ponta do mamilo feito um botão de elevador que aperta.
não dessa vez, não seria dessa vez, mas da outra que ele caiu sobre umas latas de óleo, ela lhe foi socorrer e ele gritou de dor mentida, e lhe segurou a barra do vestido, a coxa em propósito. o cotovelo roçou as nádegas que se viam continuamente à noite no quarto do seu pai. o episódio passou logo ao esquecimento público.
não, não era nada disso. a questão que importa é a ponta do mamilo. aquela menina viu tudo, a doente, a que levantava as saias. e ela viu e abriu os olhos que tiveram então o drobro do tamanho acostumado, e ele viu que ela viu e foi então que apertou o mamilo da dona entre o polegar e o indicador, se sentiu duro - o que, cínico - e os dentes da menina atrás da prateleira apareceram porque ela abriu a boca, a boca se abriu sozinha por indesviável que foi, ele queria nela. nos peitinhos pequenos das curtas mãos que levantavam as saias sozinhas em plena hora da missa. diziam que a garota era doente porque, de concreto, escrevia números com Pilot azul na perna. ela levantara a saia tão alto que, certa vez, chegou a tampar a cara toda, só se viam as pernas, as equações e a barriga e ele, esse rapaz, esse menino, sentia um medo alguns anos mais velhos; sentiu um osso da estranha compulsão, quase até torpor ou choque e ia pra casa e não esquecia estirado em baixo da cama, dos estrados, pensando na surra que ela levou na praça duma das senhoras que cantava na igreja: a mãe, a sua mãe, não lhe dá nada de vergonha!! a calcinha azul.

o livro do braço do sofá, ele acabou esbarrando e... ele ficou no chão, o livro... por quanto tempo? Maria caiu de repente jogada com a boca na sua barriga e ficou assim muito mais tempo que se podia contar nos dias em que fica chovendo e intransitável; ela rolava a cabeça a boca com as mãos apertando o acento agudo do sofá, guturando, até mesmo chorando. a farta disposição dos cabelos. mas por que na barriga, desgraça? a mente, refastelada em desejos da ordem do sempre ser dito, nunca em voz alta - já que era bêbabo, mas contido; que, latejando no pescoço dela, fechou o olho pruma paralisia de Raskolnikov.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Clube do Coma: como tentar entender

canário Kiwi em fuga da câmera: transparência


(enquanto dura o álcool)

sinto que dessa vez, por só nessa primeira vez, queria que entendessem. penso por que: porque, quando assisto novela, quero entender. o obscurantismo foge de mim, não escolhi. enfim ...

A HISTÓRIA
basicamente, o Clube do Coma é uma história que apela pra um absurdo inicial "almodovariano" (almodovariano!).
é sobre duas mulheres que se conhecem num acidente de ônibus imaginam daí uma ligação, imaginam, a partir do que houve. nesse acidente uma garota morre partida ao meio por uma chapa de aço. essas duas mulheres são a Tereza e a Maria da Glória: a primeira vê o corpo da tal menina ser guilhotinado e tenta unir novamente as duas partes, a segunda vê a mesma coisa, mas impede Tereza de continuar com o que está fazendo já que a outra está claramente morta.

noutra ponta, e o que dá o nome, é sobre um lugar, um teatro, onde as pessoas podem subir ao palco para contar suas histórias à uma platéia mascarada.

NARRAÇÕES
algumas coisas contribuem pra que a história fique confusa... primeiro é que é esse o modo escrito em que me sinto mais confortável, por isso persisto nele confiando que cada um terá um entendimento próprio, que acho que multiplica as possibilidades de cada linha. se bem que agora eu não queria isso, queria clareza - e não dá pé.
no Clube do Coma, a narração tem me parecido ser a coisa mais causadora de absurdos já que são vários narradores, com várias visões e que contam as coisas em tempos diferentes, nada ali é linear. numa hora sou eu, noutra Maria, noutro a defunta; é possível que se misturem. penso que entender o meio-folhetim passa por conseguir identificar quem diz o que.

PERSONAGENS
são quatro personagens, se eu for inclusa, se outras coisas forem inclusas.

personagem que morre: não há compromissos com os limites do pensar o sentir de qualquer quem seja, por isso os últimos pensamentos da morta envolvem sentimentos que não são seus, mas das outras duas personagens que realmente existiram. não há mais o que dizer.

Tereza: é um estereótipo que existe por aí nalgum lugar, é uma mulher bem feita, forte e isolada. como todo o resto do conto, Tereza é uma metáfora. ah sim, tudo se trata duma metáfora gigante e certamente inúltil: Tereza é um corpo e só o corpo. sua comunicação se dá pelos gestor, por simplesmente e essencialmente existir, pelo sexo, pela força bruta e pelo silêncio da impossibilidade de comunicação sofisticada.
é semi-analfabeta, fugida de onde nasceu, de onde cresceu e com quem casou num último e primeiro impulso do corpo pra ser só corpo, corpo só. tem volúpia, chama atenção nisso. é abrupta.

Maria: seria o inverso, acho, da Tereza. Maria esqueceu de ter corpo, é só abstração, é só inexistência concreta; um imenso interior de força criativa, pensamentos não-concretos. (obs: a história ainda não é toda minha conhecida; ela não me apareceu inteira como um romance, é algo que vou sabendo agora). tem sua criatividade só de alma, inteligência de isolamento e estudo. Nasceu da água, ela diz, nasceu sem querer, foi criada também num sem querer.

a Câmera: penso que seja eu, assim como a morta sou eu. a câmera se encarrega de detalhar as coisas vistas. descreve e conta. descreve e conta. só.

o Cão: o homem bêbado que está sempre à porta de Tereza. não sei quem é direito... sei que, hoje sei, que ele fez amor com Maria num dia abafado. deve ter daqueles tormentos fortes que acabam gerando compreensão sobre os outros, por isso ele compreende, por isso saca um corpo de Maria.

MOTE
mote? e eu sei direito? todo autor deve fazer auto retrato porque os pintores fazem auto-retratos, então o Clube do Coma é um auto-retrato eterno, multiplicado, até enfadonho. a morta e partida ao meio, são assim duas trajetórias completamente diferentes. aliás, as trajetórias surgiram antes que essa morte viesse; imaginava essas duas mulheres (uma, fruto da minha inveja, outra, fruto dum expansionismo humano, da multiplicação), mas não sabia como duas entidades díspares iam se juntar. foi assim que, narrando a história, sem querer (também) morri nela. foi só então aí nesse evento estranho, absurdo mesmo que elas se juntaram; digo que se juntaram pelos dedos porque Maria começou a gritar e segurou as mãos de Tereza. ficaram assim tempo o suficiente.

LUGAR
não conheço outro Rio de Janeiro além do inventado, por isso é ele. Maria, parece, vive na Rua Fonte da Saudade e Tereza entre Santa Teresa e Santo Cristo. o resto é um monte de rua e casinha que ninguém nem quer saber, só eu e tem bastado (fita enlaçarada de antipatia)
como a cerveja acabou, não posso continuar escrevendo. espero que essas linhas sejam úteis.

ADENDO EM DIA SEGUINTE: não escrevo mais bêbada...
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