domingo, 2 de setembro de 2007

A falta da janela aberta

notas
eu quero que você fique porque estou ficando cega.
como está seu olho?
chorando
se me desencontro mais, me perco.

janela aberta
ficou olhando no espelho no intervalo entre uma refeição e outra (sempre, sem vírgulas) realmente pensando que estava mais magra, que os dias que passava infame dando goles e beijos cada um mais aleatório que o outro e até pagando as contas de luz, procurando emprego de um lado pro outro, cansada e magra. o olho fundo não tem a poesia dos olho de queda onde os homens se perdem; os olhos 'tavam tão fundos que tinha até aviso pra que ninguém caísse lá dentro. calhou d'eu passar na hora e ficar olhando ela olhando pra ela e se achando magra. virou pra mim, riu e disse que saúde é de perder igual tarracha de brinco... um vestido só alinhavado pra apertar mais depois e acompanhar os ossos que iam desmilingüindo no papel de doente. quem mais ia aparecer pra visitar? eu abri as janelas e ela sentou no sofá quieta como se fosse católica: quem mais sofre é a falta de janela aberta... o vestido e aquele tom de voz que parecia uma senhora de tão antiga. quase tive vontade de chorar porque ela era cortante como flor amarela e agora de vestido branco ou azul dependendo de como a luz batia. passa essa boca pra lá que eu abro sempre as janelas, isso é pra insistir! e o espelho ali em cima das coxas, pegava a mão e esticava a cara em direção às orelhas. depois encostou o pé no cachorro e dormiu pedindo um embalo, foi como se eu tivesse andado cansada e teimosa. guardei nossos laços com o cuidado de sempre e cantei baixo até chover aqui dentro.
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imagem: il medo di flickr

2 comentários:

Cris Martins disse...

Adoro essa sua insanidade literária. Teus escritos são afagos nas almas desses loucos que somos.
Ótimo domingo.

Ricardo Rayol disse...

Gosto desse tema da janela aberta, dá mil possibilidades de escrita.

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