segunda-feira, 19 de maio de 2008

O Clube do Coma #9 apresenta pouco Maria



Grace (...)

And when she walks on the street
You can hear the strings
Grace(...)
(Grace)


Maria tem delírios de deus e escorre tantos ventos tortos, tantas visões nubladas do que acha que é a si ou aos outros que estou indo sem vontade encontrá-la. se encheu de tanta tristeza que só existe nos abandonados. Maria quase esquecida em alguma bancada mas, como é que ela se lembra disso? como eu queria não saber... como eu queria...
a mãe descobriu que estava grávida quando foi limpar o piso da cozinha com ácido sulfúrico e parou de respirar, isso já tinham quatro meses. Maria vingou como doença de velho isso ninguém entendia. devia se chamar Sidarta, devia... ela saiu de dentro dos ovários, das trompas, já pronta feito o rabos dos cavalos que viram violino. eles tentaram esquecê-la e mal compreendo o que deu errado; de repente haviam mil e duzentos olhos olhando o casal que nem queriam nada, principalmente a mãe, o pai não teve de carregar nada em lugar nenhum do corpo, ignorou como quando ninguém reparou que quase pararam de vender Coca em garrafa de vidro. iam caminhando para longe e, de repente, haviam aqueles mil duzentos e trinta olhos que, em seguida, ela estava embrulhada naqueles panos pesados, bons, quentes. levaram pra casa porque era assim que dizia no livro: não pecarás contra o Senhor Teu Deus.

o dia depois do acidente se seguiu ao dia do acidente, e talvez outro. ela não se lembrava do que tinha visto, sabia: MULHER É ESQUARTEJADA EM ACIDENTE DE ÔNIBUS; mas o que? como? viu que a mulher morreu, não sabe de que, não sabe por que. talvez ela não tivesse morrido não. Maria achava que tinha inventado, foi por isso que não contou a ninguém. Maria também não fala, tem medo de mentir, e, como não sabe nem, inventa.

fico parada, fico sentada entre as minhas calmas e ela tem delírios de Deus, e escorrem ventos tortos.

esperadamente percebo que ela nunca me toca, ela só me toca pelas mãos de Tereza... não queria hoje falar de Tereza, nem pensar no nome com z. devia ir lá ver você, Maria da Glória, devia tentar parar de acreditar nas suas boas intenções porque acho que elas não existem mesmo, acho que a sua doçura é muito cruel. você é tão cheia... tão cheia... quando ela fala é música, significação, e ela se move em cantiga de escárnio, e ela espirra existências, e ela é outras, outros, e ela nunca coube no papel. seus pés é que escorrem, ela se infiltra pelas ruas, pelos celulares das pessoas, ela dança e me deixa feliz feito um poodle amestrado. ela fica sozinha pra sempre por não comunicar a lógica. Nunca, nunca. ela toca com as mãos frias, não me toca Maria. Maria ama os corpos, ela descobre que os corpos mastigam, ela passa horas nos cabelos dos outros, nos rins dos outros. ela sabe ver. descreve. ela só sabe ver. só acho que ela queria era parar de ver. descansar e dormir, morrer... ela não sabe, ela gosta dos homens, das mulheres, Maria se esfrega nas paredes pra tinta...
assim foi que a mulher morreu, cortada no meio e ela segurou a mão da outra porque a outra queria juntar a mulher novamente. como? sangrava muito, muito... os pés ficaram muito, muito, muito vermelhos. como ela queria reter! ela ia esquecendo... igual sonho. o dia todo era igual sonho que você acorda no meio e não sabe bem se...

o ônibus, a batida, a morte, a esquartejada; saiu tudo no jornal. estava lá eu numas fotos e foi tão triste... eu não queria ler esses jornais, mas li. foi tão triste...
Maria seguiu Tereza porque não conseguia mais soltar da sua mão, foram para o hospital e não largava o pulso - não era a mão, era o pulso, e o jornal fotografou, ela não soltava o pulso. Maria seguiu Tereza. Maria seguiu Tereza. Maria seguiu Tereza. Maria não largava os pulsos mais de Tereza porque ninguém se importava, ninguém. Acabou.





Era época de tangerinas: (sabemos que a Rua Fonte da Saudade não cabe, a Lagoa não cabe em Santa Tereza, nem em Santo Cristo, não sei porque agora elas estão juntas. Maria da Glória é infértil e é queda, é como cair, é um cair monótono e demora a chegar o fundo, você pensa em tantas coisas no caminho... Não entendo).



nos meus sonhos, eu afogava meus arrependimentos
mas meus arrependimentos...
eles aprenderam a nadar
(untill the end of the world)

Um comentário:

Anônimo disse...

os meus arrependimentos aprenderam a nadar e se encontram com peixes. Lua em peixes, descobri ontem. vindo para o trabalho outro dia percebi que tenho, sim, um arrependimento. dois, talvez, mas o que encontrei é o único que me acompanha todos os dias. que coisa. não me incomoda, mas também agora não tenho mais a doce ilusão de não me arrepender de nada e de que podia levar essa filosofia porta além trancas como se tivesse toda a razão do mundo.

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